Quando leio alguma variação de “vocês não deveriam ficar de indiretas com essa tag #MeuAmigoSecreto”, eu penso: amigo, você não leu NENHUMA das publicações com um mínimo de atenção. Se quem escreve comentários como o mencionado tivesse prestado alguma atenção nos relatos que as mulheres têm publicado nas redes sociais, perceberia que a maioria menciona diferentes maneiras como os homens agem para nos silenciar quando apontamos comportamentos machistas: chamam de maluca, dizem que é a mulher que vê problema em tudo, que ela é vitimista, … A lista é grande e não se limita a situações constrangedoras e xingamentos.
Muitos relatos da tag #MeuPrimeiroAssédio trouxeram a tona situações que são estupro, mas muitas vezes as próprias vítimas não sabiam que o que tinha acontecido com elas era estupro. Estupro é crime, está tipificado no Art. 213 do Código Penal, e nunca é demais citar mais uma vez: “Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso.” E o Art. 215 tipifica a Violação sexual mediante fraude: “Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com alguém, mediante fraude ou outro meio que impeça ou dificulte a livre manifestação de vontade da vítima.” São crimes, chocam qualquer pessoa com um mínimo de vontade de ter empatia com as vítimas.
A tag #MeuAmigoSecreto, por outro lado, finalmente, traz atitudes do dia a dia que todos, TODOS, os homens praticaram alguma vez na vida. E isso causa estranhamento: “Como assim eu, que apóio as causas feministas, também sou um machista? Não! Não sou, não!” Sim, amigo. É, Sim. Até mesmo os homens conscientes sobre a urgência das pautas feministas para uma sociedade mais justa tem atitudes machistas, porque é o ethos da sociedade em que vivemos, porque é difícil perceber os próprios privilégios, porque é díficil admitir que é preciso repensar e mudar as próprias atitudes.
Ao usar uma tag em vez de mencionar nomes, é dada a todos que já fizeram o que está sendo relatado a oportunidade de perceber que agiram de forma machista. E a tag é para provocar, sim: no sentido de tentar fazer todos os que acharem que seus nomes estariam no lugar da tag mudem suas atitudes. E é isso que as mulheres, com todos os diferentes relatos, estão dizendo em uníssono: “sim, você tem atitudes machistas e elas machucam, repense suas atitudes”.
E, já que uma das atitudes machistas é não prestar atenção no que as mulheres dizem e escrevem, termino esse post com as palavras do Pedro Cunha, que publicou em seu perfil no Facebook:
Gurias: sensacional. Tá bonito de ver. Mesmo. Guris: primeiro, entendam que não é para nós postarmos com a hashtag. Isso não é para nós. É um momento delas, de denúncia, de descarrego e muitas vezes de exorcismo mesmo. Quer participar? Então leia os posts e se encontre ali. Você talvez não esteja em todos, mas em alguns com certeza esteve. Talvez você não esteja hoje, mas tem certeza que nunca esteve? Se acha que não, leia novamente. Até se achar. Porque, meu amigo, todos nós estamos lá. Se dê conta que as vezes a piada, a brincadeira, a “chegada” pode ter sido bem traumatizante para alguém. Depois de se identificar, identifique os amigos. Os brothers. Os parceiros. E não seja conivente: diga que a piada não tem graça. Não deixe ele se aproveitar da moça que bebeu. Saia do grupo de WhatsApp que compartilha fotos de mulheres nuas, e explique o porquê de estar saindo. A melhor maneira de ajudarmos é entre nós mesmos. E, acredite, temos muita coisa para fazer.”